DICAS DE GRAVAÇÃO E MIXAGEM
Amigos, apresento aqui algumas dicas simples de gravação e mixagem para músicos e produtores que trabalham por conta própria em seus home-studios. Minha intenção é falar sobre algumas formas de trabalho que gosto, e que considero importantes para quem grava e mixa por conta própria.
Pré Produção
O planejamento ou pré-produção são fundamentais em qualquer projeto de gravação com intenções profissionais. Antes de dar inicio às gravações é importante definir muito bem os timbres que serão gravados. Isso inclui, escolha de instrumentos, regulagens, cordas, peles, afinações, amplificadores, pedais, etc. Tudo deve ser testado e definido antes do inicio das gravações.
Reserve também um tempo para fazer experiências de captação, com microfones, prés, conversores, cabos, posicionamentos, etc. Experimente até definir o setup ideal dentro dos recursos disponíveis. Não se esconda atrás da desculpa que seus equipamentos não são bons o bastante. Ao invés disso questione-se se está extraindo o melhor que seus recursos lhe oferecem e gaste o tempo que for necessário para garantir que uma boa captação será feita.
Devemos sempre nos lembrar da importância de gravar bem, pois com o avanço da tecnologia muitos acreditam que processamentos podem fazer milagres e acabam ficando mais relaxados na hora de captar, pensando que depois tudo poderá ser corrigido na mixagem ou na masterização. A possibilidade de correção e manipulação é realmente grande, mas deixar a qualidade de nossa gravação dependente de correções e processamentos, definitivamente não é o caminho. O segredo de uma boa gravação está muito mais na captação do que no processamento. O processamento virá depois para realçar um bom timbre captado ou para corrigir diferenças que não foram possíveis acertar na captação.
Veja as palavras do técnico Jim Scott ao mixar um famoso álbum do Red Hot Chilli Peppers, "Nosso ponto de partida foi a gravação que já soava tão bem! Na verdade soou muito bem desde o primeiro dia, então não havia necessidade de alteração. Queria ter tido um pouco mais de trabalho na mixagem. Tudo que precisei fazer foi ajustar os volumes!"
Claro que estamos falando de uma gravação feita nas melhores condições e com todos os recursos possíveis, além de músicos experientes. É muito provável que em uma produção mais simples a mixagem vá além de apenas ajustes de volumes, mas vale como exemplo de que o segredo definitivamente está em gravar bem. A gravação sempre será a matéria prima do trabalho de áudio e quanto menos precisarmos alterá-la melhor será o resultado final.
Pode ter certeza de que os álbuns dos seus artistas favoritos soam tão bem porque antes de mais nada foram muito bem captados. Em grandes projetos de áudio profissional você verá grande empenho durante o planejamento e captação para que as etapas seguintes possam fluir tranquilamente.
Resolução de Bits (Bit Depth)
Sugiro que a captação seja feita em 24 bits, e que a mixagem seja feita nesta mesma resolução ou se possível, mais alto. Para quem possui sistemas que suportam 32bit (float), a edição e mixagem podem ser feitas nesta resolução, que trabalha com alta margem dinâmica e garante grande precisão para edições e processamentos. Jamais reduza a resolução de bits dos seus arquivos ou utilize dither. Todo o trabalho de gravação, edição, mixagem e masterização devem ser feitos em resoluções de bits altas, e só reduzido pelo técnico de masterização na última etapa do trabalho.
Taxa de Amostragem (Sample Rate)
Quanto mais alto melhor. Se possível faça suas gravações em 88.2 ou 96 kHz, pois além dos conversores trabalharem com mais precisão nestas taxas, o processamento digital também soará melhor. Toda distorção e degradação que o processamento digital pode gerar serão distribuídas em regiões inaudíveis, deixando o processamento digital com uma sonoridade mais analógica. É importante que nenhum tipo de conversão de sample rate seja feita durante todo o processo de gravação, edição, mixagem e masterização. A taxa de amostragem só será reduzida pelo técnico de masterização quando todo o trabalho estiver concluído.
Trabalhe com Margem
Ajuste os níveis de entrada para a gravação com picos máximos em -6 dBFS. Esta margem é importante para evitar que o sinal atinja o limite máximo (0 dBFS) que poderá gerar perdas e distorções irreverséveis. Peça aos músicos para tocarem no nível máximo que pretendem atingir em seus instrumentos e a partir desta intensidade ajuste o sinal de entrada em -6 dB. Desta forma você garante que mesmo nos momentos mais fortes da música sua gravação não irão clipar.
Panorama
Uma boa distribuiçãoo dos elementos em estéreo faz grande diferença na mixagem. O Pan nos ajuda a encontrar espaços para distribuir os elementos da melhor maneira. Timbres com predominância na mesma região podem acabar brigando por espaço na mixagem e o posicionamento do Pan pode ajudar a resolver o problema. Principalmente se a gravação for muito cheia, trabalhe com o Pan para encontrar o espaço ideal de cada elemento. Um bom panorama estéreo pode enriquecer muito sua mixagem.
Equalização
Quando a captação é feita adequadamente a necessidade de equalização diminui muito. Se você sentir necessidade de fortes correções com o equalizador é sinal de que algo está errado com o timbre captado e talvez seja melhor captar novamente. Avalie as reais necessidades de equalização e faça apenas alterações leves e naturais. Técnicos pouco experientes costumam pensar que TUDO precisa ser equalizado e "timbrado". Mas lembre-se que excesso de equalização soa desagradável e artificial. Então só faremos uso desta ferramento quando houver real necessidade ou intenção artistica.
Trabalhe com equalizadores paramétricos de quatro ou cinco bandas que serão mais que suficientes para as necessidades de sua mixagem. Utilize curvas abertas e naturais atenuando ou elevando toda uma região de frequências e evite regiões estreitas ou frequências isoladas.
As regiões de frequências são divididas da seguinte forma:
Sub-graves de 0 à 25 Hz (Esta não é uma região musical e pode ser cortada)
Graves de 25 à 120 Hz
Médios-graves de 120 à 350 Hz
Médios de 350 à 2000 Hz
Médios-agudos de 2000 à 8000 Hz
Agudos de 8000 à 12000 Hz
Banda de Ar de 12000 à 22000 Hz
Na hora de equalizar considere sempre estas regiões e utilize curvas abertas, ajustando a frequência no centro de cada região que necessite de correção. Faça experiências com todos os timbres, aumentando e reduzindo cada região para identificar onde se encontram seus harmônicos principais. Desta forma você aprenderá a reconhecer as regiões predominantes de cada timbre, podendo reconhecê-las em casos de ajustes. Avalie sempre as reais necessidades de equalização e busque resultados alinhados para cada elemento de sua mixagem. Mantenha-se focado na tentativa de reproduzir o timbre como ele realmente é. Lembre-se da forma que seus ouvidos captam cada timbre diretamente de sua fonte sonora e busque um resultado fiel em suas gravações.
Compressão
Compressores são ferramentas que visam o controle da variação entre os níveis de intensidade dos sons, que podem variar muito, principalmente em instrumentos acústicos e vozes. Com exceção de estilos mais puristas como o Jazz e a Música Clássica, as mixagens modernas trabalham com muita compressão. Em toda a história da música nunca foram ouvidas gravações tão comprimidas como nos dias de hoje. Praticamente tudo que se houve em rádio e TV têm forte compressão.
O uso correto dos compressores pode fazer toda a diferença em sua mxagem, realçando timbres e aumentando sua presença. Técnicos menos experientes tentam equalizar os timbres em busca de mais destaque para eles, quando na verdade muitos casos necessitam apenas de uma boa compressão. Se a variação de intensidade de determinado timbre é muito grande, é provável que ele fique um tanto perdido em meio aos outros elementos, variando em momentos de maior ou menor destaque. Mixagens profissionais têm todos os elementos em destaque, com clareza e presença, e isso se deve muito a compressão. É muito importante o conhecimento e domínio deste tipo de ferramenta. Compressão não é um assunto fácil e pode comprometer sua gravação se não aplicada corretamente. É recomendável praticar e estudar muito o assunto, pois uma das maiores diferenças na sonoridade dos produtores mais experientes está justamente na compressão.
Ambiência
Quando ouvimos um instrumento, chega aos nossos ouvidos o timbre do instrumento somado à reverberação do ambiente. O som do ambiente é um componente importante da música, mas nem sempre é possível captarmos com ambiência adequada. Muitos estúdios, principalmente os domésticos têm sonoridade excessivamente seca, e neste caso pode ser importante o uso de um bom reverb para emular um ambiente mais favorável à música.
Referências
Utilizar uma gravação profissional como referência e comparação na hora de fazer uma mixagem é algo muito útil, principalmente para quem não tem bons monitores de áudio e uma sala com tratamento acústico adequado. Cada estilo musical trabalha dentro de determinados padrões de mixagem e o uso de uma gravação profissional como comparação é importante para quem ainda está aprendendo a trabalhar dentro destes padrões, e para quem não possui uma resposta sonora realmente confiável em seu estúdio.
A gravação usada como referência provavelmente estará masterizada e com um nível de intensidade sonora maior que sua mixagem. Para não se enganar com esta diferença, importe a referência para dentro da sessão de sua mixagem e deixe o canal em mute. Colocando-o em solo e voltando para mute você fará uma comparação rápida entre a referência e sua mixagem. Reduza o volume da referência até que se iguale à sua para que você possa fazer uma comparação mais justa. Não utilize nenhum plug-in ou processamento no canal de saída (stereo out) da mixagem para não alterar a sonoridade da referência.
Conclusão
É importante que um bom tempo seja gasto na hora de escolher os timbres e captar, na tentativa de garantir a melhor gravação possível. Tendo bons timbres registrados, a etapa de processamento e aplicação de efeitos deve ser feita com cuidado e critério, somente quando houver real necessidade ou intenção. E talvez a dica mais interessante para os produtores iniciantes seja o uso de gravações profissional como comparação. Obviamente que ao usarmos uma referência não estamos tentando imitar a sonoridade e nem queremos que a nossa mixagem perca a originalidade, mas a referência é importante para nos situarmos dentro do padrão de mercado e evitarmos erros devido a alguma deficiência do sistema de som, falta de experiência ou até mesmo o cansaço de nossos ouvidos.
Em outras épocas só era possível gravar um álbum musical gastando muito dinheiro em grandes estúdios, e este era um sonho que poucos podiam realizar. Porém nos dias de hoje qualquer um com um computador, uma placa de som e um microfone consegue se aventurar no mundo do áudio e da produção musical. Por um lado, as facilidades da tecnologia tornam este sonho possível para muita gente, e por outro, a qualidade das gravações caiu muito por não estar somente nas mãos dos profissionais como era feito antigamente.
O trabalho com áudio é bastante complexo e exige muita dedicação, prática e estudo. Geralmente os bons técnicos possuem no mínimo dez anos de experiência no assunto. É preciso acumular muita experiência e conhecimento. Procure livros, vídeos, cursos, estágios em grandes estúdios e pratique muito. A tecnologia de áudio não pára de avançar e as facilidades estão ai, mas a qualidade dos trabalhos SEMPRE dependerá do fator humano. Preocupe-se mais com seus conhecimentos do que com equipamentos. Qualquer um com dinheiro pode comprar um avião, mas pilotá-lo são outros quinhentos.
Boa sorte e boas gravações a todos,
JHUN BLACK